Emily voltou para casa. Parecia um pouco triste, mas esperava que o dia conseguisse levantar seu astral. Cindy já havia viajado para visitar a sua mãe. Emily nunca se sentiu tão sozinha. Arrumou o que estava bagunçado na casa, tomou um banho e deitou para descansar. Pegou no sono até ser acordada pelo toque do seu celular. Levantou assustada e percebera que já era noite. Olhou o celular que estava na mesinha ao lado de sua cama e atendeu.
- Alô! Emily?
- Oi sweetheart. Chegou bem? A viagem foi boa?
- Sim! Cheguei bem e ocorreu tudo ótimo. Vou só desarrumar minhas malas aos poucos e descansar. Amanhã mesmo já vou com alguns residentes para um hospital aqui em Havana.
- Que bom. Descanse bastante.
- Eu irei.
- Ethan...
- Oi.
- Eu te amo, não esquece isso.
- Claro que eu não vou esquecer. Por que você está falando isso?
- Nada. Eu só quero que você não se esqueça disso.
- Eu não vou esquecer Emily, por que eu também amo você. Olha... Eu tenho que desligar, mas amanhã te ligo novamente. Ok?
- OK. Boa noite Ethan.
- Boa noite Em.
Emily desligou o celular e se levantou. Esticou cada músculo do seu corpo e foi andando em direção à janela. Essa segunda feira estava com cara de fim de semana. Ficou um tempo ali até ouvir seu celular tocar novamente. Emily ainda não havia falado com Cindy. Ela viajara bem cedo para cidade vizinha enquanto Emily dormia.
- Oi Cindy, tudo bem?
- OI Emily. Não muito. Vou precisar passar a noite aqui com minha mãe. Então resolvi ligar para avisar que não vou dormir essa noite em casa e talvez não volte amanhã, vai depender da melhora dela.
- Mas o que ela tem? Os médicos já descobriram?
- Eles acham que é algum tipo tumor, mas ainda estão fazendo alguns exames. Eu estou preocupada Emily.
- Não fique assim. Sua mãe precisa de você forte do lado dela. Quer que eu vá ai ficar com vocês?
- Não precisa Em. Prefiro que você vá para a faculdade e anote tudo. Quando eu chegar pego todas as matérias.
- OK. Se você prefere assim... Mas qualquer coisa que você precisar Cindy, pode me ligar que eu vou correndo para ai, certo?
- Obrigada, mas suponho que você não vá precisar fazer nenhum esforço.
- Te vejo em breve.
- Beijos.
...
A mãe de Logan havia preparado uma torta de maçã enquanto nós jogávamos Guitar Hero. Para falar a verdade eu adoro rock de todos os tipos. Enquanto a música tocava, eu podia me lembrar de quando era mais jovem e integrante de uma banda chamada Os Camelos. Tudo começou com rodinhas na escola, depois foi crescendo e até conseguimos gravar uma demo, mas o tempo foi ficando curto, surgiram algumas brigas e a banda acabou antes mesmo de estourar. Eu tocava guitarra e era o vocalista. As garotas enlouqueciam com minha voz. Eu adorava compor também. Sempre fui romântico e dramático, então minhas canções não podiam ser diferentes. Tinham uma pegada forte de letra suave. Há muito tempo eu não pegava em um violão. Cheguei a escrever músicas para minhas namoradas. Sempre tem uma música que te faz lembrar alguém. Eu tenho várias. Para cada tipo de pessoa, cada dia do ano, cada momento especial. Bom... Se minha vida fosse uma discografia, seria das mais diversas canções e definitivamente, sem fim. Jogamos até cansar. Comemos da magnífica torta e ficamos sentados no tapete da sala. Um tapete estilo indiano com detalhes cor de vinho.
- Vocês querem continuar jogando? Perguntou Logan.
- Por mim já basta. Respondi deitando a cabeça no sofá.
- Por mim também. Respondeu Sarah em seguida.
Continuei com a cabeça deitada, olhando para o teto. Houve um pouco de silêncio.
- Pensando em alguma coisa Tom? Perguntou Sarah.
- Ele pensa? Respondeu Logan sorrindo.
Sorri também.
- Nada. Apenas pensando.
- Se alguma coisa estiver te perturbando, você pode conversar com a gente, não é Logan?
- Claro. Eu sei que não é grande coisa, mas...
- Logan cala a boca. Respondi.
- Calei. Baixou a cabeça.
- Eu posso fazer uma pergunta a vocês? Mas eu quero que sejam sinceros.
Sarah fez sinal de sim.
- O que vocês acham de mim?
Logan fez cara de que não entendeu a pergunta.
- Como assim? Perguntou Sarah.
- Vocês me acham... Não sei. Chato?
- Você chato? Respondeu Sarah.
- Quando você quer. Respondeu Logan.
- Logan! Gritou Sarah.
- O que foi? Ele pediu para ser sincero.
Eu sorri.
- Você não é chato Tommy. Mas por que você está perguntando isso? Falou Sarah.
- Nada. Eu só queria saber.
- Não. Pelo pouco que eu conheço de você, sei que alguma coisa aconteceu para você estar perguntando isso. Você é sempre tão confiante. Falou novamente Sarah.
- Acho que sua convivência comigo está afetando sua cabeça. Disse Logan.
- Por que afetaria? Respondi.
- Tommy, crise existencial é coisa de nerd.
Todos nos rimos.
- Alguém disse que você era chato? Voltou a falar Logan.
- Uma amiga de Emily. Se lembra dela?
- E tem como esquecer?
- Eu não sei, mas às vezes sinto que afasto as pessoas.
- Espera. Falou Sarah. – Eu tenho que gravar esse momento. Tommy Bernold vai se autocriticar.
- Nossa, eu sou tão... Como eu posso dizer?
- Metido? Brincou Sarah. - É! Mas a gente gosta de você assim mesmo.
- Sério?
- Por que você acha que eu não entendo por que você quer ser meu amigo? Respondeu Logan. – Tommy se duvidar nem minha mãe acredita que somos amigos. Continuou.
- Ela falou isso? Espera. Eu gosto de vocês, por isso somos amigos.
- Nos sabemos. Respondeu Sarah. – Amizade tem dessas coisas mesmo. Não é por que você é bonito e tem esse olhar que balança qualquer garota, que você não possa ter amigos como nós.
- Tirando a parte do olhar. Interrompeu Logan. – Eu concordo com Sarah.
Sorrimos.
- Bom eu acho que por hoje é só né? Chega de ficar aqui me detonando. Acho que vou para casa. Falei.
- Eu também vou. Disse Sarah.
- Quer que eu te deixe em casa? Perguntei.
- Não precisa se preocupar.
- De jeito nenhum. Logan diga a sua mãe que a torta estava maravilhosa. Aproveita e leva um pedaço para mim amanhã. Ok?
- Sem problema.
Logan nos deixou na porta.
- Tchau Tommy. Tchau Sarah.
Sarah e eu formos caminhando pelas ruas um pouco movimentadas. Afinal era segunda feira. Chegamos à casa de Sarah.
- Quer água ou alguma coisa? Perguntou ela.
- Não, obrigado. Comi e bebi bastante na casa de Logan.
- Obrigada por me acompanhar até aqui.
- Disponha.
- Tommy, posso falar uma coisa?
- Claro.
- Não se preocupe com o que as pessoas pensam de você. Seja você e ponto final.
- Você está certa.
- Você é esperto, engraçado, bonito.
Fiquei um pouco envergonhado.
- Você pode parar se quiser. Digamos que eu não seja acostumado a elogios assim.
Sorrimos.
- Quer saber? Tem uma garota...
- Sabia que tinha alguma nessa estória.
- Eu não sei Sarah. Eu não a conheço bem. Não gostei muito dela no princípio, mas tivemos a oportunidade de conversar um pouco. Ela mostrou um lado dela que eu pensava que não existia sabe?
- Sei.
- Eu gostei de conhecer aquilo, mas eu sei também que ela não gosta muito de mim. A gente se fala educadamente, mas eu queria estar errado sobre algumas coisas que eu venho pensando.
- Deixa vê se eu entendi. Aquela garota que você e Logan estavam falando é uma coisa completamente diferente do que você pensava que fosse,e agora você está apaixonado por ela?
Olhei para Sarah com cara de assustado.
- Calma, eu não disse que estava apaixonado, apenas que tinha visto um lado dela diferente. Eu também nem quero me apaixonar por ninguém e se fosse acontecer, que não fosse ela.
- Então qual o problema? Por que você se importa se ela te acha legal ou não?
- Não sei. Esse é o problema. Eu não sei por que eu me importo com o que ela pensa de mim.
- Sabe o que eu acho?
Fiz sinal para que prosseguisse.
- Que você sente atração por ela. Interesse. Sabe por quê? Por que ela desafia tudo que você tem medo de enfrentar. Esse seu orgulho não deixa. Você quer tentar, mas tem medo. Ela não deve ser nenhum monstro de sete cabeças. Talvez seja melhor conversar com ela. Sei lá.
- Conversar com ela? De jeito nenhum.
- Então você deixa o tempo passar e vê se essa agonia que você está sentindo passa. Por que só há dois caminhos Tommy: ou você quer ou você não quer. Então qual vai ser?
...
Larguei da escola. Resolvi voltar por um caminho diferente. Passei pelo famoso campus da faculdade. Aquele lugar era realmente tranquilizante. Acho que é o verde da grama, e alguns passarinhos que pousam sobre ela para se alimentar no verão, ou a brancura dela por causa dos flocos de neve no inverno. Se eu morasse em Rosetown antes de me formar, com certeza gostaria de ter estudado lá. Fui andando devagar para apreciar o vento que ficava mais quente a cada dia que passava. A primavera estava chegando e minha curiosidade era imensa, de saber se as flores realmente ficam iguais as dos filmes. Resolvi sentar em um banco de algumas das mesas espalhadas por lá. Ficava rindo de algumas pessoas que passavam. Sentei e fiquei ali um bom tempo até senti que alguém se aproximava. Sabe aquele friozinho nas costas? Exatamente o que eu senti quando Emily chegou perto.
- Tommy? O que você faz por aqui?
Me virei. Nessa hora não sabia se sentia mais frio na pele, nas costas ou no coração. Engoli um pouco de saliva e respondi.
- Oi Emily.
Ela foi andando em direção ao banco para se sentar.
- Você ainda não respondeu a minha pergunta.
Sorri.
- Nada. Eu apenas estava dando uma olhada ao redor. É proibido?
- Não.
- Veio sozinha? Cadê sua amiga Cindy?
- Sim. Cindy está viajando. Foi ver a mãe que está doente.
- Eu encontrei com ela um dia desses. Ela saia de uma farmácia. Perguntei se ela estava bem e ela terminou comentando da mãe.
- Ela falou sobre isso. Disse que você a chamou de mal educada.
- Como? Sorri. – Não. Eu não disse isso. Eu apenas quis que ela me desse pelo menos um tchau quando fosse embora. Mas não importa cada um entende do jeito que quiser. Está tudo bem com a mãe dela?
- Não muito. Parece que é câncer.
- Nossa. Cindy está bem?
- Na medida do possível.
- Eu sinto muito.
- É.
Ficamos um pouco em silêncio. O vento empurrava os cabelos de Emily. Como ela conseguia ter aquele rosto tão angelical? Respirei e tentei puxar assunto.
- E você? Como é que está?
- Estou bem.
- Soube que o seu ex-namorado viajou.
- Na verdade ele ainda é meu namorado.
- Eu achei...
- Achou errado. Interrompeu.
- Desculpa. Mas ele foi para onde mesmo?
- Cuba. Fazer residência. Mas falo com ele todos os dias pelo celular ou pela internet.
- Que bom. Dizem que os melhores médicos saem de lá. Espero que ele seja um dos melhores.
- Ele será. Ethan tem capacidade para fazer o que ele quiser.
- Se você diz... E você faz o que?
- Jornalismo. Concluo daqui a alguns meses.
- Sério? Bacana. Eu sou formado em publicidade e quando preciso faço alguns bicos de fotógrafo também.
- Mesmo?
- Uhum. Se você quiser posso te mostrar alguns trabalhos meus. Você já sabe em que área quer atuar?
- Não sei. É tão amplo esse ramo. Às vezes quero ser repórter, às vezes redatora.
- Você pode ser os dois. Se você quiser posso te mandar vários arquivos que eu tenho falando sobre essa área de comunicação. Quem sabe não te ajuda.
- Você faria isso mesmo?
- Claro. Só tem um problema.
- Qual?
- Os arquivos são em português e um pouco grandes, então pode levar um tempo para traduzir.
Emily sorriu.
- Não precisa se preocupar. Daqui para o final do curso eu escolho algum caminho.
- Espero que o certo.
- Eu também. Acho que agora eu vou indo. Bom qualquer dia a gente marca para eu ver seus trabalhos.
- Claro. Você tem meu número?
- Não.
- Espera.
Retirei meu caderno. Anotei meu número em um pedaço de papel e entreguei a ela. Ela dobrou cuidadosamente o colocou no bolso.